Por Antonio Tozzi

Governança Corporativa. O nome pode parecer pomposo, soar até um pouco fora de moda. Entretanto, o consultor empresarial Eduardo J. Valério investiu neste segmento e se tornou um papa nesta área. Tanto que publicou o livro “Empresa Familiar – Governança e os Seus Desafios”.

Mais do que um livro, essa obra serve como guia para as empresas familiares que em certo momento precisam enfrentar o dilema da passagem de bastão. Ou seja, o fundador da companhia está chegando em uma idade em que já não pode mais ficar o tempo todo à frente do empreendimento. Os motivos são diversos, porém, todos desaguam num ponto: a dúvida do empresário para saber quem é suficientemente competente para tocar sua empresa após seu afastamento.

Ler o livro é uma tarefa obrigatória para aqueles que vislumbram o futuro da companhia além de seu período como gestor. Encarei o desafio de ler – e procurar entender – porque governança corporative é essencial para a continuidade de um negócio. Aliás, o livro tem prefácio do engenheiro Marcelo Almeida, um dos acionistas do Grupo CR Almeida, que fez fama e fortuna no ramo da construção civil – ele, por sinal, envolvido no processo sucessório de seu pai, o respeitado (e temido) Cecílio do Rego Almeida.

Dividido em capítulo curtos e com linguagem acessível, o livro foca o sisema de governança corporativa no tripé Família, Patrrimônio/Gestão e Empresa/Gestão. Respeitar essas divisões é fundamental para a troca de comando fluir de maneira mais natural e com mais probabilidade de evitar solução de continuidade.

“O primeiro passo em direção à governança descomplicada é desenvolver o acordo societário.”Essa é a premissa básica para qualquer empresa funcionar, pois assinatura de contrato entre os sócios é o ponto de partida em toda atividade. Batizado por Valério como protocolo societário, surgem os tópicos e os itens sob os quais devem estar ancorada a governança corporativa: subsistema familiar (critérios para a sucessão, para o ingresso de familiares na empresa, para a demissão de familiares na empresa, para negócios fora do negócio e oportunidades conjuntas de investimento); subsistema societário (direito de preferência, processo de vendas de participação e cotas da empresa entre sócios e para com terceiros, código de ética, distribuição de lucros e dividendos, decisão de desinvestimentos e formação de conselhode administração); subsistema de gestão (normas de gestão para conduzir os negócios, estrutura organizacional com definição dos fóruns de decisão dentro da empresa, definição das laçadas para investimentos e despesas, definição das linhas de competências dos principais gestores, processo de avaliação da performance). Por sua experiência, Valério estipula em cerca de quatro meses o tempo para assinatura final dos instrumentos e o início dos trabalhos.

A profissionalização da empresa familiar passa necessariamente por uma boa liderança e implantação do planejamento estratégico está diretamente conectada a três pilares: comunicação, motivação, engajamento.

Quando é o momento ideal para definir o processo de governança corporativa?

Essa é uma pergunta recorrente feita à Eduardo J. Valério. Embora não haja uma data ou época específica, ele não hesita em afirmar que a definição do processo de governança corporativa deve começar o mais cedo possível. Afinal, o planejamento evita ou diminui momentos de instabilidade que possam extrapolar os muros da empresa. Traduzindo: conflitos internos são percebidos pelo público externo e isto pode gerar uma crise maid difícil de se administrar. Uma empresa conturbada tem mais dificuldade para captar recursos no mercado como, por exemplo, empréstimo bancário; fornecedores podem ficar mais reticentes ao fornecer prazos de pagamentos mais longos, e os clientes podem optar por concorrentes se não sentirem confiança.

Assim, é fundamental determinar a todos sócios como tudo funciona, inclusive os dividendos/lucros. A fim de facilitar a governança em uma empresa familiar, é necessário definir quem deve ser o presidente do conselho de sócios, o presidente executivo (CEO) e o presidente do conselho de administração. Normalmente, costuma haver ingerências entre estas funções, até porque os próprios sócios-fundadores é quem são guindados ou eleitos para estes cargos. No entanto, Valério frisa ser ideal que cada um fique em sua área de atuação e, claro, nas reuniões empresariais devem ser trocadas informações, sugestões, queixas e sobretudo decisões.

Com base nessas divisões de funções, torna-se mais fácil coordenar o processo sucessório. Entretanto, é um processo muitas vezes doloroso por envolver egos, desejos e expectativas. Cabe aos sócios-fundadores saber escolher quem será o novo comandante da empresa a fim de torná-la ainda mais competitiva no mercado. E isto pode provocar atritos entre os próprios sócios – o sócio A pode não aprovar a escolha do filho B para gerir o negócio, por exemplo – e entre os familiars, afinal, todos ambicionam estar na posição de comando. Isto, porém, implica liderança, competência, dedicação etc. Todos sabemos que estas qualidades são escassas, portanto, muitas vezes o patriarca tem de ter a coragem de preterir o filho mais velho em favor do mais novo ou até mesmo buscar no mercado um profissional que seja capacitado para administrar a empresa.

Essa, aliás, é a diferença entre “empresa familiar” e “família empresária”. Família empresária é aquela em que os papéis e as responsabilidades dos familiares com relação à empresa, bem como a relação entre os sócios, estão baseados num conjunto claro de regras. Já empresa familiar ainda não está com essas regras planejadas e implantadas. E saber fazer esta distinção é meio caminho andado para o processo sucessório dar certo.

Não existe, porém, nenhuma fórmula mágica, a não ser um trabalho incessante em busca do aperfeiçoamento, sempre com o objetivo de aparar as arestas e pavimentar o caminho para que o sucessor consiga não só manter as conquistas de seus antecessores como também aumentar o grau de sucesso, tornando a empresa ainda mais conceituada em seu segmento de atuação. Se isto for obtido, Eduardo J. Valério considera missão cumprida seu trabalho como consultor empresarial.